A rádio, tal como a
televisão, chegou a Cabo Verde pelas mãos de curiosos. Segundo Raul Barbosa, um
antigo locutor, hoje reformado, a primeira emissão radiofónica oficial data de
Maio de 1945, tendo o então responsável da Marconi na Praia, Tomás Dias, feito
um emissor de ondas curtas que garantiu durante muito tempo a existência da
Rádio Clube de Cabo Verde, a primeira estação radiofónica do país.
Ainda por altura da final
da II Guerra Mundial, surgiria em
S. Vicente, a Rádio Barlavento e a Rádio “Pedro Afonso”, que
seria proibida por não ter autorização oficial. De acordo com Mário Matos
(pai), em 13 de Setembro de 1946, surgiria a Rádio Clube do Mindelo, onde
haveria de pontificar o seu irmão Evandro, já falecido.
Geralmente, os nossos “homens
da rádio” eram funcionários públicos, adeptos do rádio-amadorismo, que
procuravam nas horas de lazer animar a pacata vida do arquipélago. Para além
destas, a rádio atraiu também respeitosos intelectuais. Jaime Figueiredo e
Arnaldo França, na Praia; António Aurélio Gonçalves e João Cleofas Martins ou Sérgio
Fruzoni, no Mindelo, são alguns exemplos.
Contudo, o período diário
de emissão de todas elas não passava de escassas horas, e a profissionalização
só chegava com a independência. Rabi Barbosa conta que, para o serviço
noticioso local, a Rádio Clube de Cabo Verde baseava-se inicialmente no
material que a secção de Propaganda da Imprensa Nacional e, mais tarde, no do Centro
de Informação e Turismo. As notícias referentes a Portugal e ao mundo eram fornecidas
pela agência Lusitânia.
Para sobreviver a Rádio
Clube recebia um subsídio do Estado e da Câmara Municipal da Praia para além
das quotizações dos seus sócios. Hilário Brito que chegou a dirigir o gabinete
técnico da Rádio Clube conta que a primeira instalação dessa emissora funcionou
no primeiro andar da Casa Serbam. Mais tarde foi construído um edifício no
Ténis, à frente dos Correios, e só muito depois é que passou para as
instalações actuais da RNCV.
Entre os bons e maus
momentos que viveu, Raul Barbosa conta que a PIDE mandou-o chamar duas vezes
para responder uma acusação de que tinha de que tinha deturpado uma notícia
relacionada com Portugal. “A segunda vez – acrescenta – mandaram-me chamar
porque uma notícia em que se afirmava que Amilcar Cabral era terrorista, li o
texto sem mencionar a palavra terrorista.”
Com o 25 de Abril, a rádio
acabou por desempenhar o papel de grande mobilizador dos espíritos. S. Vicente
acabou por protagonizar um dos momentos mais marcantes desse período, com
“tomada” popular da Rádio Barlavento, que era acusada de anti-PAIGC e contra a
independência, passando a chamar-se então Rádio Voz de S. Vicente, e hoje
estúdios do Mindelo da RNCV.
Entretanto, a Rádio Clube
do Mindelo acabaria por morrer em 1977 por falta de recursos. “Não havia
interesse em haver mais de uma rádio em S. Vicente, tratando-se ainda por cima de uma
rádio privada”, conta Carlos Afonso, que aprendeu os mistérios da profissão
tendo como um dos seus mestres o irreverente Evandro de Matos.
A Rádio Clube do Mindelo é
ainda hoje considerada um autêntico viveiro de profissionais. Por ela começam,
entre outros, António Pedro Rocha, Carlos Lima, João Matos, alguns dos quais a
trabalhar no exterior.
Com a abertura do sector, é
provável que a rádio venha a ganhar um novo fôlego, num país em que ainda é o
principal meio de comunicação social, existe um vasto terreno por explorar,
principalmente em termos de rádios regionais.
Fora isso, a RNCV, tal como
a TNCV têm sofrido enormemente com a falta de concorrentes. Do comodismo,
típico de quem está só no terreno, tem resultado um serviço asséptico ou pouco
dinâmico, o que contrasta com as características desse meio de comunicação
social. Com a concorrência à porta é de fazer votos para que alguma coisa venha
a mudar nas nossas ondas sonoras.
in VP – 24.10.91
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