segunda-feira, agosto 06, 2012

O Elo Mais Fraco I

Depois de vários anos à espera de políticas públicas eficazes que permitam à comunicação social responder com qualidade aos desafios inerentes ao processo de graduação de Cabo Verde a país de rendimento médio, assim como desempenhar com sucesso as suas atribuições numa sociedade que ser quer moderna e democrática, fomos, finalmente, brindados com um plano estratégico para o sector. No essencial, o documento recupera o diagnóstico já gasto e propõe uma terapêutica bastas vezes ventilada.

O plano de acção para a comunicação social cabo-verdiana, cujos traços gerais foram elencados durante o fórum “Caminhos da Liberdade” organizado pela DGCS, identifica como pontos fortes do nosso campo mediático, a liberdade de imprensa, o enquadramento legal, as reformas legislativas em curso, profissionais jovens, motivados, e à espera de oportunidades para mostrarem o que valem, a cobertura nacional da TCV, e parcerias com entidades estrangeiras.

Quanto aos pontos fracos, o estudo não poderia ter sido mais elucidativo: deficiente fiscalização, ausência de estudos de audiência, incipiente digitalização a nível das infra-estruturas e equipamentos, fraco controlo de gestão, dificuldades financeiras das empresas e uma forte dependência do Estado.

Deste cenário se conclui que é grande a responsabilidade que impende sobre o Estado. Desde logo, no sentido criar as condições que estimulem a competitividade do sector, mas também por ser o maior grupo económico (e ideológico) da comunicação social. Convém não esquecer que, apesar de ter deixado cair o jornal Horizonte, em 2007, o Estado detém ainda uma rádio e uma televisão públicas, que dominam o mercado audiovisual, e uma agência de notícias.

Soa a paradoxo estar a defender a independência e a autonomia da imprensa e, ao mesmo tempo, a exigir que o Estado garanta a sustentabilidade das pequenas e medias empresas que laboram no campo mediático. Contudo, o actual estádio de desenvolvimento em que se encontra a quase totalidade dos meios de comunicação social obriga a que adopte, através de mecanismos transparentes, uma política consistente de incentivos, sobretudo, aos órgãos privados.

Se se considera que a imprensa é um dos pilares fundamentais para o processo de transformação de Cabo Verde, compete ao Estado encontrar mecanismos que permitam financiar o seu desenvolvimento e a sua modernização. Em bom rigor, é chegado o momento de a comunicação social constar da agenda de prioridades do governo, de quem se espera, aliás, uma visão estratégica e políticas públicas claras. Os desafios que Cabo Verde tem pela frente são ingentes e só serão vencidos, ou, minimizados, com o concurso de uma comunicação social forte e autónoma, capaz de contribuir para o debate das grandes questões que se nos colocam nesta encruzilhada do desenvolvimento.

No sector público, no obstante alguns investimentos, as reformas estruturantes estão ainda por se fazer. Comecemos pelo financiamento. Desde a criação da RTC, já lá vão quinze anos, ouve-se falar na assinatura de um contrato de concessão entre a Rádio e Televisão cabo-verdiana e o Estado. Trata-se de um mecanismo que irá clarificar as obrigações das partes em matéria de prestação de serviço público aos cidadãos. Mais do que os recursos financeiras - as responsabilidades do estado serão acrescidas – julgo que tem faltado vontade política para se dar o passo decisivo com vista à autonomia e à independência da RTC.

Há ainda uma outra questão que, recorrentemente, vem à tona, sobretudo com o aproximar das eleições. Falo da reestruturação da RTC. Na conferência para assinalar os 10 anos da criação da RTC, realizada em 2007, a então ministra, Sara Lopes, mostrava-se convicta dessa reforma: “Uma prioridade para os próximos meses será a reestruturação da RTC, com vista a reduzir e eliminar paulatinamente os elementos de ineficiência. A estrutura organizacional da empresa, a transferência tecnológica que é urgente, a adequação do quadro de pessoal em termos de perfil, mas também o peso de pessoal na estrutura de custos da empresa, são decisões que deverão ser tomadas com urgência para que possamos criar as condições básicas para que a RTC possa estar a altura das expectativas dos cabo-verdianos.

Entre o plano das intenções e a execução das decisões, vai uma grande distância. É basta ler os programas dos governos para se aquilatar do desfasamento entre o discurso e a prática. Razão tem o presidente do conselho de administração da Inforpress ao dizer que a empresa não constituiu, nos últimos anos, prioridade semelhante aos restantes serviços do estado. “Na verdade, os duodécimos canalizados para efeitos de funcionamento e outras despesas afins não têm sido actualizados desde 2002, sendo também verdade que os investimentos por parte dos sucessivos executivos têm-se revelado francamente insuficientes” (Correia, 2011).

Como dar o salto rumo à modernização almejada com níveis minguados de investimento? Note-se que no caso da agência, a situação tende a complicar-se uma vez que por lei está impedida de se socorrer da publicidade para o seu financiamento. O princípio do “utilizador-pagador” afigura-se como uma estratégia inteligente para a rentabilização financeira da empresa, mas depende da qualidade e da diversificação dos conteúdos.

O Governo prometeu levar ao Parlamento, no primeiro trimestre de 2008, algumas medidas no sentido de promover a reestruturação da televisão e da rádio, e de renovar os mecanismos de financiamento que, no dizer da então tutela, “neste momento seguem modelos pouco eficazes, porque irregular, porque imprevisível. Sara Lopes lembrou, no entanto, que nem sempre se diz tudo aquilo que o Estado investe na comunicação social, sobretudo na RTC.

A comparticipação do Estado nos órgãos públicos, esclareceu a ministra, não se restringe apenas ao subsídio de compensação indemnizatória. “A maior parte dos investimentos realizados, seja com vista a se conseguir a universalização da cobertura, que é um objectivo prioritário, a modernização tecnológica e a criação das condições de trabalho, passam, quase sempre, pelo financiamento do Estado, seja através do orçamento do estado, seja através de meios financeiros mobilizados através da ajuda ao desenvolvimento”.

Uma coisa é certa, os contratos de concessão com a RTC e a Inforpress continuam a marcar passo. Com a rádio e a televisão o documento, em princípio, pode ser assinado ainda no decorrer deste ano, pelo menos, é esta a promessa do chefe do Governo que, contudo, foi lembrando que a empresa dispõe da taxa paga pelos cidadãos através das facturas de electricidade. A ver vamos.