sexta-feira, julho 24, 2009

PARABÉNS RCV

A Rádio de Cabo Verde foi ontem distinguida com um prémio pela cobertura jornalística que vem dedicando à Cidade velha. Foi a forma encontrada pela autarquia da Ribeira Grande de Santiago de reconhecer o trabalho desenvolvido pela RCV que, nos últimos tempos, tem de facto centrado a sua atenção no berço da nacionalidade.

Pese embora o simbolismo deste prémio, tem, pelo menos, o mérito de nos mostrar que é possível fazer mais e melhor. Isso passa, obviamente, por uma melhor organização interna, pelo derrube de alguns constrangimentos que interferem na engrenagem da produção informativa; por uma aposta na formação dos profissionais; na especialização por editorias; numa gestão de informação assente numa visão estratégica…

O mais importante: melhorar a motivação dos jornalistas e demais profissionais. Isso passa, claro, por desbloquear a carreira dos jornalistas (paralisada há quase dez anos), apostando no mérito e na competência, o que se consegue com a avaliação de desempenho. Colocar toda a gente no mesmo saco só contribui para a apatia e desmotivação gerais.

É de elementar justiça frisar que a distinção com que a Câmara Municipal da Rª Grande de Santiago achou por bem presentear a Rádio de Cabo Verde, no dia do município, se deve ao desempenho do jornalista Elisângelo Ramos (um dos mentores deste blogue) que, apaixonado pelas questões culturais, tem produzido excelentes reportagens sobre a cidade-berço. De entre estes trabalhos destacamos a série de reportagens especiais “Cidade Velha: Pedras que falam”.

Ainda no passado domingo, o jornalista produziu e apresentou um documento extremamente valioso sobre a atribuição à Cidade Velha do estatuto de Património da Humanidade. “O Sorriso da Nação”, assim se chama a grande reportagem que recupera esse género infelizmente desaparecido da rádio.

O Elisângelo fê-lo explorando as virtualidades da acústica da rádio, permitindo ao ouvinte experimentar outras sensações que não apenas através da audição. Ao ouvir a reportagem, vêem-se as grossas bátegas de água a acariciar a terra, rolando depois pelas ribeiras ressequidas; o céu a desabar com grande estrondo sobre a rua banana e o pelourinho; as caravelas a aproarem para junto da praia; sente-se o gemido contido do negro ao ser chicoteado junto da picota. De repente, ouve-se o repicar dos sinos na Sé; o céu abre-se num sorriso de alegria. É o sorriso das gentes simples que doravante só querem ver a sua vida melhorada… sim porque a cidade velha está na boca do mundo.

Lamento que o jornalista não tenha submetido esta grande reportagem ao prémio de jornalismo António da Noli. Por falar nisso, talvez o concurso ganhasse mais participação e competitividade se houvesse uma divisão por categorias: uma para a rádio, outra para a televisão e uma outra para a imprensa. Já agora que se aumente o valor do prémio. Jornalismo de investigação dá trabalho e custa dinheiro.

Na era da imagem, torna-se difícil, senão mesmo impossível, a rádio bater a televisão neste tipo de concursos. Por mais criativa que a reportagem da rádio seja. A televisão continua a fascinar com o poder demolidor da imagem. Não é à toa que é conhecida pela “caixa mágica”. Muito difícil será a tarefa para os jornais.

Ainda assim, gostaria de dar os parabéns a Isabel Silva Costa pelo excelente trabalho sobre a Cidade Velha. Uma série de pequenas peças, reportagens, bem elaboradas, numa escrita acessível, simples, própria da televisão. Isso demonstra que às vezes os recursos técnicos não são tão importantes. A criatividade, a inovação e a qualidade fazem toda a diferença. Para quê investir em megas produções, sumptuosas em termos de recursos técnicos e humanos, de orçamentos milionários, para o produto ser visto por meia dúzia de elites que acham que a televisão é cultura de massas?





quinta-feira, julho 23, 2009

OUVINTES MAIS EXIGENTES

Ao contrário do que acontece com as rádios temáticas, Praia FM, Crioula FM e Cidade FM, as rádios generalistas não procuram ter como alvo um público específico (p.e. jovens) na sua área de difusão, mas satisfazer o conjunto do público.

Isso obriga as rádios a considerarem os hábitos de audição e exigências de cada um dos públicos potenciais. Os jovens, os reformados, os desempregados, as donas de casa, os amantes de música jazz, de desporto… terão todos uma ou mais emissões que lhes são dedicadas, programas que vão ao encontro dos seus hábitos de audição radiofónica.

As rádios generalistas precisam de uma equipa de competências tão variadas quanto as suas emissões: informações, magazines, deporto, produção de programas culturais, económicos, políticos, animação de antena, etc. Em traços gerais, são rádios que se escutam com mais atenção do que as rádios musicais que simplesmente se ouvem.

No nosso panorama radiofónico, podemos apontar como exemplos de rádios generalistas, a Rádio Nova, a Rádio Comercial, a Rádio Educativa e a Rádio de Cabo Verde. Apesar de terem uma audiência delimitada, pela natureza da sua missão, as rádios comunitárias devem ter uma programação generalista. Contudo, cabe à RCV uma definição clara da sua programação devido ao compromisso que mantém com o Estado no sentido de prestar aos cabo-verdianos um serviço público de qualidade.

A exigência de um serviço público de rádio está, aliás, inscrita na Constituição da Republica (art. 9º) e desdobra-se na restante legislação do sector, com destaque para a lei da comunicação social (lei nº 56/v/98) e da rádio (lei nº 10/93).

Como muito bem disse há tempos neste blogue um seguidor atento, não existe diferença acentuada entre jornalistas da rádio e da televisão públicas e jornalistas dos órgãos privados, embora àqueles que trabalham nos órgãos de comunicação social de serviço público lhes seja exigido o cumprimento escrupuloso das normas éticas e deontológicas da profissão, bem como uma maior consciência da responsabilidade social adveniente do estatuto de operador público.

De igual modo, pensamos que não há um jornalismo para o serviço público de rádio e um jornalismo para as estações privadas. Mas, pode (e deve) haver uma informação que será mais específica aos operadores públicos. Até porque, uma estação pública e uma estação privada não seguem, pelo menos teoricamente, a mesma engenharia de programação e as mesmas prioridades.

Significa isso dizer que a grelha de um canal generalista de serviço público, no que diz respeito à informação, não pode ser saturada de conteúdos de entretenimento, nomeadamente em horário nobre, devendo, antes, ocupar esse segmento com formatos que contextualizem acontecimentos, que promovam o debate social e que ajudem a dar relevância a realidades que permanecem na sombra.

Embora seja difícil encontrar uma única definição que nos remeta para a essência de uma informação de serviço público, podemos expor algumas linhas de acção para uma programação de informação para os canais públicos. Assim devem:

Proporcionar uma visão global e contextualizadora dos factos;
Procurar o contraste de fontes diversificadas;
Fazer uma rigorosa depuração dos factos;
Promover o aprofundamento das consequências sociais, politicas e económicas dos factos;
Debater-se por um equilíbrio na cobertura territorial, social e cultural;
Introduzir um enfoque pluralista e imparcial nas opiniões veiculadas.

Será que estamos a fazer isso? Não é essa, pelo menos, a opinião das pessoas ouvidas em sede do segundo inquérito à satisfação e audimentria dos órgãos de comunicação social. Exigem que os conteúdos (a começar pelas notícias/programas de informação) sejam variados e de qualidade.

terça-feira, julho 21, 2009

OS DIAS DA RÁDIO

Nuno Sardinha (RDP-África) e Carlos Santos (RCV)
O último inquérito à satisfação e audimentria dos órgãos de comunicação social traz alguns dados que nos interpelam a uma reflexão crítica aturada. Tarefa que cabe a todos, profissionais, ouvintes, leitores e telespectadores mas, sobretudo, aos responsáveis pela gestão dos órgãos.

Não é minha intenção fazê-lo neste blogue. De todo o modo, apraz-me tecer alguns comentários, tendo, desde logo, como ponto de partida, os resultados da pesquisa sobre as rádios.

Uma vez que a pesquisa se realizou em Março deste ano, não se percebe por que não existem, em todo o estudo, quaisquer referências à RCV+, o canal jovem da Rádio de Cabo Verde. Espera-se que a direcção da RCV tenha já requerido explicações plausíveis à Direcção Geral da Comunicação Social, promotora do estudo, e que esteja em condições de no-las apresentar.

A RCV+ está no ar desde os finais de Dezembro de 2007, tem uma programação própria, de 24 horas non stop, dirigida preferencialmente ao segmento jovem do público. Tem frequência própria, 95.5, a mesma que é também sintonizada em S. Vicente e arredores.

A não inclusão da RCV+ na medição do grau de satisfação dos ouvintes e de audimetria beneficia directamente a Praia FM, estação que aliás consolidou a sua posição de liderança na capital e alargou a sua notoriedade dirigida a nível nacional. Aliás, diga-se em abono da verdade, a jovem estação é a que, de acordo com os dados, mais subiu, apesar de a RCV ter mantido a sua posição de líder de audiência a nível nacional.

Ora, acreditamos que caso a RCV+ fosse tida em conta no questionário, a Praia FM não teria os resultados que alcançou. Convém não esquecer que em Cabo Verde o efeito novidade conta muito. A Praia FM está há dez anos no ar e já apresenta alguma saturação em termos do formato. Isso não significa que a RCV+ não precisa reavaliar a sua estratégia, aproximando-se mais das expectativas do seu público.

Não deixa contudo de ser estranho que a RCV+ não apareça sequer na “notoriedade espontânea”. Ou seja, quando se pede ao ouvinte que indique os nomes (aqueles de que se recorda) de algumas rádios que costuma ouvir. Ninguém se ter lembrado da RCV+, é obra!

Muito estranho. A RCV+ é silenciada e inclui-se no estudo uma rádio que há um ano está fora do ar: a Mosteiros FM. Como é possível que se peça aos inquiridos que se pronunciem sobre a programação de uma rádio que, no momento da realização do inquérito, está fechada devido ao acumular de constrangimentos técnicos e financeiros?

Quando é que em Portugal se ia meter num estudo da audiência apenas a RDP, esquecendo-se que ela se divide em canais: Antena 1, Antena 2, Antena 3, RDP-Africa, etc? A própria RR tem também o seu canal jovem, a RFM que é, aliás, líder de audiências. Bom, deixemos este descaso para os responsáveis.

O estudo mostra que há ainda em Cabo Verde um número considerável de pessoas que ouvem a rádio mais de 6 horas por dia, mas há, contudo indicações de que esse cenário está a mudar. Com o passar dos anos, com a massificação da Internet, com uma oferta televisiva cada vez mais de qualidade, a rádio irá gradualmente perder audiência, embora jamais deixará de ser ouvida. O que é certo que as audiências não serão tão astronómicas como as que se registam hoje.

O estudo faz uma divisão de águas em relação a audiência das várias rádios. Mostra que a RCV e, em menor grau, a Rádio Nova, têm a preferência dos adultos (mais homens) e sobretudo daqueles que possuem o pós-secundário. A Praia FM e a Crioula FM são mais apreciadas pelos jovens, o que não surpreende, uma vez que são estações temáticas (música e publicidade) direccionadas à faixa dos 14 aos 25 anos.

Falemos dos conteúdos. Os inquiridos pedem programas variados e de qualidade. As notícias devem ser melhoradas dizem os ouvintes que, para já, dão preferência à música. Os programas de debate, culturais e educativos merecem a preferência de apenas (pasme-se) 7% dos inquiridos. Isto dá que pensar, por isso deixo-o para o próximo post.

segunda-feira, julho 20, 2009

Brasil: diploma de jornalismo já não é obrigatório

O Supremo Tribunal Federal brasileiro acaba de decidir que o diploma de ensino superior como condição para o exercício legal do jornalismo não pode mais ser considerado obrigatório. A notícia acaba de ser dada por Rogério Christofoletti, no blog Monitorando, mas está em muitos outros sítios.

Esta decisão segue-se a anos de polémicas e de processos em sucessivas instâncis do sistema judicial brasileiro. O assunto dividia claramente as opiniões no sector dos media, ainda que se notasse uma clivagem de posições entre uma boa parte da classe jornalística e de pesquisadores do jornalismo), por um lado, e os responsáveis de empresas mediáticas e respectivas associações, por outro. Estes últimos defendiam, claro está, a liberalização do processo de entrada na profissão.

Este assunto é muito interessante, do ponto de vista da análise comparativa. Na Europa, por exemplo, na esmagadora maioria dos países, a exigência de requisitos para além dos básicos, não é aceite. E quando o legislador quer tornar obrigatória a titularidade de um diploma, como aconteceu recentemente em Portugal, a oposição surge de imediato. A questão coloca-se entre o direito e a liberdade de informar, que as constituições democráticas consagram, e que não pode ser objecto de limitações, e o direito dos cidadãos a uma informação de qualidade, necessária, inclusive, ao exercício esclarecido da própria liberdade e direito de informar e do exercício da cidadania, em geral.

Recorde-se que, em processo paralelo a este, nos últimos meses, tem decorrido, também no Brasil, um debate para a definição de directrizes curriculares para a formação superior em Jornalismo. O processo é coordenado por uma comissão nomeada pelo Governo Federal e presidida pelo prof. Marques de Melo. Depois de várias reuniões com parceiros e audições públicas, está previsto que o relatório final seja entregue em Agosto próximo.

Fonte: Jornalismo e Comunicação