terça-feira, dezembro 20, 2011

Vez e voz aos portadores de deficiência

A Universidade Jean Piaget de Cabo Verde, em parceria com a ADVIC, lançou, na semana passada, a primeira edição em Braille do jornal Expresso das Ilhas. O projecto, que também irá abarcar os demais semanários, reveste-se de uma dimensão social incalculável.

Não obstante a periodicidade ser, no imediato, mensal, este gesto vai permitir que os invisuais, sobretudo os alfabetizados em braille, acompanhem a actualidade informativa através da imprensa escrita. Num contexto de manifesta carência de conteúdos em formato passível de usufruto por parte das pessoas totalmente cegas ou amblíopes, com baixa visão, a iniciativa é, a todos os títulos, louvável, representando um marco importante na história da imprensa cabo-verdiana.

De acordo com o I Relatório Nacional de Direitos Humanos, em Cabo Verde, não obstante se consagrar em forma de lei que os grupos vulneráveis – em que se incluem as pessoas com necessidades físicas e mentais especiais – devem merecer especial protecção da família, da sociedade e dos poderes públicos, o que pressupõe a observância dos deveres de respeito e de solidariedade para com os portadores de deficiência, existe um quadro de inquestionável défice de inclusão, de protecção e de dignificação dessas pessoas.

Pese embora alguns ganhos tímidos nesta área, nomeadamente, na educação, saúde e cultura, há, contudo, um longo caminho a percorrer rumo à verdadeira inclusão e à satisfação dos direitos humanos das pessoas com necessidades especiais. Infelizmente os media nacionais, temos que o admitir, só colocam a problemática dos portadores de deficiência na sua agenda por força das efemérides ou para publicitar alguma celebração a eles associada. Num mundo em que tudo aquilo que “não passa” na televisão fica na penumbra, torna-se fundamental que essas pessoas não sejam ignoradas pela caixinha mágica, sob pena de a sua aceitação social piorar em vez de melhorar.

Na verdade, se queremos melhorar a acessibilidade, que é como quem diz, a possibilidade de as pessoas usufruírem de bens, recursos ou conteúdos que são colocados ao seu dispor, a abordagem ideal deve ser sempre a do “desenho universal”. Isto significa que tudo o que é concebido procura responder às especificidades ou necessidades do maior número possível de indivíduos.

Uma televisão de serviço público, como é o caso da TCV, que deve reger-se pelo princípio da igualdade – o que pressupõe uma atenção equitativa aos valores das maiorias e das minorias – obriga-se, entre outras medidas, à dobragem de programas em língua estrangeira; ao emprego de tecnologia que permita a conversão das legendas escritas em informação sonora (áudio captioning); à utilização de auto-descrição que se consubstancia na introdução de informação sonora sobre determinados aspectos que são essenciais para alguém que não consegue acompanhar cabalmente a narração visual da história a possa compreender. Essa informação incidirá, designadamente, sobre o contexto, as acções, expressões faciais, gestos e movimentos.

Concordamos que talvez seja pedir à nossa modesta televisão. Pensamos, no entanto, que, volvidos 27 anos de emissão, já é altura de a TCV proceder à tradução para a língua gestual e para a legenda de toda a informação relevante apresentada sob a forma sonora. Já agora, porque não começar pelo Telejornal? É apenas uma sugestão!