sexta-feira, novembro 12, 2010

Leituras Interessadas

A margem de erro estatístico das sondagens é conhecida, a qual se junta uma percentagem de erro acrescentado pela leitura apressada e rotineira dos dados. As pesquisas lêem-se mal e muitas vezes os órgãos de comunicação social transmitem uma realidade que nelas não é detectada. Não se pode contudo generalizar.

Na maioria dos casos introduzem-se incorrecções ou desvios informativos involuntários que mediatizam a leitura dos estudos de opinião. Estes são alguns dos erros mais comuns: a informação eleitoral relativa às sondagens, e em especial as manchetes redigem-se de forma incorrecta. Independentemente de que acertem ou não nos resultados, as manchetes sobre o futuro eleitoral estão por si equivocadas.

É corrente encontrar na primeira página de um qualquer jornal: “O partido X ganhará as eleições” ou “o partido y não alcançará a maioria absoluta”. Da leitura de uma sondagem não se podem tirar conclusões futuras. Quando muito, indicam tendências.

A leitura atenta da ficha técnica das sondagens permite ver como na maioria dos casos da amostra obriga a tomar certas precauções, que se omitem na redacção da informação. Se a amostra é recente, costuma ser excessivamente pequena para atribuir assento, ou, pelo contrário, se é suficientemente ampla, já passaram vários dias desde a sua realização.

Em períodos eleitorais, quando a opinião pública está em autêntica ebulição, uma semana é demasiado tempo para actualizar a publicação de uma sondagem com o título: “O partido x tem 10 pontos de vantagem sobre o partido Y”, ou, “Se as eleições fossem hoje o Partido Y alcançava…” No melhor dos casos, essa poderia chegar a ser a situação política uma semana antes da publicação da notícia.

Em outras ocasiões, as manchetes, ou a notícia, obtêm-se de perguntas que medem o clima de opinião e não a intenção de voto: “que partido ganhará as eleições?” Outras vezes, esquece-se da existência, ou a análise, de importantes grupos de indecisos. Convém por isso rever algumas práticas do jornalismo de precisão antes de se aventurar numa caça às bruxas demoscópicas.

Outro erro frequente corresponde ao tratamento informativo dos resultados obtidos nas sondagens realizadas à porta das assembleias de voto, que costumam ser tomados como dados definitivos. As rádios e as televisões, em feroz competição, apressam-se, às oito da noite, a dar os assentos que cada força politica obtém. As sondagens realizadas na porta da assembleia de voto não medem os resultados eleitorais, mas o clima de opinião em que os comícios se desenvolveram. É sim um indicativo do resultado final das simpatias dos votantes.

Neste sentido, convém recordar o conceito de simpatizante esposado por Maurice Duverger. “A figura política do simpatizante é vaga e complexa. O simpatizante é mais que um eleitor e menos do que um membro. Como eleitor dá ao partido o seu voto, mas não se limita a isso. Manifesta o seu acordo com o partido; reconhece a sua preferência política. O eleitor vota em segredo na sua cabine de voto e não revela a sua escolha; a precisão da mesma e a amplitude das medidas tomadas para garantir a descrição do escrutínio mostram a importância do facto. Um eleitor que declara o seu voto não é um simples eleitor: começa a converter-se em simpatizante” (Duverger, 1957,145).

Por assim dizer, as sondagens que se realizam à boca das urnas não fazem senão exigir ao entrevistado que converta o seu voto secreto em público, que passe de eleitor a simpatizante.

Fonte: Jornalismo e Actos da Democracia, 2007, edições MinervaCoimbra.

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