terça-feira, julho 07, 2009

A VOZ DAS COMUNIDADES


Na perspectiva do Projecto de Desenvolvimento dos Media da UNESCO “a rádio comunitária é aquela que é da comunidade, feita pela comunidade e para a comunidade”, definindo-se a comunidade como um grupo geograficamente baseado e/ou um grupo social ou sector publico que tem interesses comuns ou específicos.

Estamos a falar de uma rádio que presta um serviço sem fins lucrativos, gerida com a participação da comunidade; responde às necessidades da comunidade, serve e contribui para o seu desenvolvimento de uma maneira progressista, promovendo a mudança social, a democratização da comunicação através da participação da comunidade.

Assim sendo, a finalidade principal de uma rádio comunitária é contribuir para o desenvolvimento sócio-economico e cultural da comunidade, promovendo a cultura da paz, a democracia, os direitos humanos, a qualidade e o empowerment da comunidade onde está inserida. Em suam: uma rádio efectivamente comunitária deve estar na comunidade, servir a comunidade e ser da comunidade.

Para isso, a comunidade deverá organizar-se previamente, constituindo um órgão que possa cuidar interesses colectivos junto da rádio. Esse órgão pode ser, por exemplo, uma associação da rádio comunitária.

Continuamos a defender que não faz qualquer sentido proibir as rádios comunitárias de fazer publicidade. Aliás, para além da própria publicidade comercial, as pessoas singulares e colectivas podem fazer pequenos anúncios (missas, falecimentos, aniversários, baptizados, casamentos, venda de propriedades ou bens pessoais, convocatórias, etc.) ou publicar mensagens (de saudação ou felicitação a amigos e familiares), cujos impressos são vendidos pela rádio aos anunciantes.

Mas mais: devem ser capazes de estabelecer relações de colaboração com outros financiadores e doadores. Por exemplo, as igrejas e organizações não-governamentais podem estar interessadas em financiar a emissão de programas específicos das suas áreas de trabalho (água, saúde, meio ambiente, direitos humanos, educação cívica etc.).

Atenção: em vez do pessoal ligado à gestão das rádios perguntar às ONG em quê é que elas podem ajudar, devem-se desenhar projectos concretos, exequíveis e de grande impacto nas comunidades e apresentá-los a essas organizações. Acredite-se que elas estejam bastante receptivas, porque, afinal, as ONG também trabalham em prol das comunidades.

Por outro lado, através de inquéritos de opinião realizados pelos voluntários das rádios, devidamente formados num pequeno curso sobre pesquisa de audiência, as próprias comunidades, que de alguma forma já escutam as emissões radiofónicas (quase toda a gente tem um aparelho de rádio de banda FM), são convidadas a pronunciarem-se sobre os programas que mais gostariam de ouvir, horários das emissões, etc., embora corramos o risco de colher respostas que reflectem mais a programação da Rádio Nacional.

Sabido que o objectivo das rádios é o de servir as comunidades das áreas em que se encontram instaladas (obedecendo aos princípios de informar, formar, educar e recrear), a programação deve procurar reflectir, ao máximo, aos interesses e anseios dessas comunidades.

De todo o modo, é preferível que se comece com períodos de emissão relativamente curtos e, a medida que se for ganhando prática e se verifique que estão garantidas as condições materiais, técnicas e humanas, alargar-se os espaços de antena. O contrário - começar com muitas horas de emissão diária e depois ir diminuindo – é que fica mal.

Os ouvintes, de acordo com as alguns dados de pesquisa realizados em alguns países cuja realidade sócio-demografica e económica, se aproxima de Cabo Verde, preferem escutar principalmente noticiários, programas educativos (sobre temas diversos, incluindo de carácter moral) recreativos, teatro radiofónico ou programas de humor, programas sobre a mulher, crianças e jovens, agricultura, pecuária, deporto, debates radiofónicos.

As notícias sobre o que se passa à sua volta despertam sempre grande impacto no ouvinte, por causa da proximidade do que se relata. É sempre de valor acrescentado ouvir um vizinho a falar; saber o que se passa com o camponês que mora na esquina; com a escola onde o filho estuda; com a diversidade de produto e os preços do mercado onde costumamos fazer as nossas compras, etc.

Na escolha das notícias locais, será apenas preciso que os colaboradores das rádios comunitárias sejam perspicazes, activos, criem as suas próprias fontes de informação. Factos ou acontecimentos de actualidade, inéditos ou de interesse público haverá sempre. Para além dos noticiários locais, talvez seja importante retransmitir os principais jornais da Rádio de Cabo Verde, ou, eventualmente, algum programa de informação cujo tema seja de interesse específico para comunidade ou região.

É importante que a comunidade se faça ouvir nas emissões, quer através de cartas, debates em directo, entrevistas gravadas, inquéritos de rua, telefonemas, (e-mail, caso haja Internet disponível) ou outras formas que permitam ao ouvinte ouvir o nome ou a sua voz através da rádio.

Pese embora só muito recentemente a importância das rádios comunitárias tenha começado a fazer-se sentir, convém reflectir sobre os desafios que se lhes colocam e, sobretudo, descortinar de que forma poderão organizar-se para os enfrentar. Normalmente na fase de arranque, o projecto consegue o apoio financeiro e a assessoria técnica de alguma ONG ou parceiro público. Porém, a perspectiva é que gradualmente as rádios comunitárias se abram a outros doadores e aumentem as suas fontes de receitas, de modo a que possam em grande medida caminhar com os seus próprios pés.

Por conseguinte, o maior desafio que as rádios comunitárias enfretarão no futuro são, grosso modo, garantir a sua sustentabilidade financeira, técnica e editorial; em termos de recursos humanos e condições de trabalho. Não menos importante será a batalha para fazer com que as comunidades se sintam donas das rádios. Só desta maneira se poderá manter as rádios em funcionamento.

O pior é que entre nós, as rádios comunitárias nasceram defeituosas. Na maior parte dos casos (há excepções honrosas) a gestão das rádios é feita por associações de fachada que só servem para esconder a mão (in) visível das Câmaras Municipais. Isto é desvirtuar o conceito de rádios comunitárias. Cá está uma boa matéria para o gabinete de fiscalização da DGCS se ocupar.

Continua…


Sem comentários:

Enviar um comentário